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Isabelle Rimbaud, quem se lembra de Isabelle Rimbaud? Foi quem desenhou o irmão morto, linhas e mais linhas de um rosto a que chamou "Rimbaud mourant". Durante anos, o meu Rimbaud andou lá dentro com este Rimbaud de Isabelle recortado de um Magazine Littéraire numa reprodução infeliz sem a renda do traço de Isabelle. Então, quando Olivier Weber reúne tudo o que sabia acerca de Ella Maillart e lhe chamou "Je suis de nulle part" abre com uma citação de Isabelle Rimbaud: «Ô pieds voyageurs, retrouverais-je vos empreintes dans le sable ou sur la pierre?» Não me interessa saber da correcção da ideia, mas se me toca na sequência, se é bela. E é.
Detesto viajar, viagens, ou antes, o ritual que antecede a viagem é-me penoso. Nem sequer depende da companhia porque nunca encontrei quem me acompanhasse os meus vagares, cansaços e olhares que tudo esquecem. Sítios, rostos, ruas. Mas nunca os cheiros. É pelo cheiro que lá chego.  Ora o que me calha bem em Dudamel é que sem conhecer a Venezuela é com ele que se me chega um cheiro genuíno daquela terra. E que terra, que pátria!
Dudamel é o resultado vivo de El Sistema. A primeira vez que me falaram deste acontecimento, porque de um acontecimento se trata, foi a primeira vez que vi, aqui sentada, um filme sobre a coisa formidável construída pelo músico José António Abreu como um tecido, mais uma renda, isto mesmo, uma renda por onde passam as linhas harmoniosas dos 400 centros musicais dedicados a mais de setecentos mil jovens de meios pobres até chegarmos à Orquestra Sinfónica Símon Bolívar e a muitos mais projectos de Abreu. Criticado por alguns, El Sistema é o exemplo da utopia tal como a conta Galeano: «A utopia está lá no horizonte. Aproximo-me dois passos, ela afasta-se dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso: para que eu não deixe de caminhar» 

Em Lisboa, o calor não larga Lisboa. A Baixa continua invadida por estrangeiros que ora me incomodam muito ou nem nada. 
Gosto de passear o Cão com a camisola 
nas costas enquanto o animal anda 
aos saltos por entre as folhas. Não estas.
Estas são de Bruxelas, colhidas nos chãos
daquela cidade onde a floresta não se 
afasta e está ali como o Tejo aqui.

Simone Weil escreveu um livro que não encontro, mas tenho ou tinha, «L'enracinement». Simone escrevia, entre outros, a Camus e este tinha por ela um amor intelectual que o levaria a elogios sentidos, sem fim. Não seria para menos. Camus sobre este preciso livro: «Il me paraît impossible d’imaginer pour l’Europe une renaissance qui ne tienne pas compte des exigences que Simone Weil a définies dans L’Enracinement». De tão genuíno bem 
dizer sobre as «necessidades da alma» 
na vez dos «direitos do homem» 

               e as «obrigações perante

              os seres humanos» como se

              pode reduzir «L'enracinement» 

               de Simone Weil? Na memória do                                   passado. No que o passado

        traz. Assim: «"La perte du passé, collective ou individuelle, est la plus grande tragédie humaine et nous avons jeté le nôtre comme un enfant déchire une rose...»

Tudo em mim se liga a tudo. Nada se separa de nada. É a alma, o rendilhado desta que me encanta ou afasta. Quando Weil afirma «L'argent détruit les racines partout où il pénètre, en remplaçant tous les mobiles par le désir de gagner» não me diz nada que não conheça ou reconheça. Sendo o dinheiro um dos meus temas,        uma das minhas obsessões,    
          não pelo ter,

             mas precisamente pelo que faz                            a quem o não tem, como se dá aos                                        que precisam, a quantidade 
de afecto que existe em cada moeda
que a deixo aqui e ali, cai-me do bolso
roto das calças de ganga propositadamente
rotas. E no pensar de Weil contra Bonnot, o anarquista, criminoso, disrupto, de quem ainda se diz exemplarmente "la bande à Bonnot" como grupo de pessoas fora da lei, que tudo e todos desrespeitam. Pois aqui o meu coração não balança. Há poucas pessoas que me fazem parar a olhar, de paixão, no meio da rua como naquele filme em que ela, a dona de casa, morre de amor              e desejo pelo desconhecido

              da estação de comboios, creio.

               De recordar, com esforço,

            recorrendo a esquemas meus

              a quem a memória falha a todo o                                  momento, encontro o título

                  «Brief Encounter» e o realizador perfeito: David Lean. Foi o filme da vida do Teotónio Pereira, o que muito me espantou. É do tempo em que as mulheres vestiam com uma elegância inigualável e os homens usavam chapéu e eram amáveis? Não sei. 

Pois se nem sequer sei como vim aqui parar. 

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